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Afastamentos de trabalho por doenças mentais aumentam 200% na Bahia em dez anos
Bancários são a categoria com o maior número de casos, seguidos por profissionais de atividade hospitalar
Segunda-Feira, 01 de Setembro de 2025

Novas formas de trabalho, metas cada vez mais difíceis de serem atingidas e uma pandemia que afetou diretamente as relações sociais. Esses são alguns dos aspectos que levaram a um resultado que preocupa autoridades e profissionais de saúde: em dez anos, os afastamentos de postos de trabalho por conta de questões de saúde mental aumentaram mais de 200%, na Bahia.
A concessão de benefícios previdenciários por doenças mentais passou de 5.020, em 2014, para 15.189, no ano passado. Antes disso, as maiores altas tinham sido em 2023, com 8.898 afastamentos e em 2020, primeiro ano da pandemia da covid-19, com 8.443 casos no estado. Os dados são do SmartLab BR, plataforma do Ministério Público do Trabalho (MPT) em parceria com entidades como a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e Ministérios como o da Saúde e o do Trabalho e Emprego.

“Foi um aumento bem expressivo, principalmente se você considerar o panorama de 2022 a 2024, que pega o final da pandemia e teve um papel fundamental no estímulo a esse aumento, com a questão da plataformização dos ambientes de trabalho, o uso da tecnologia e o teletrabalho. Tudo isso facilita muito a vida das pessoas, mas também é um fator que gera adoecimento e aumento dos afastamentos”, analisa a procuradora do trabalho Carolina Novais.

O afastamento, em geral, é a última medida nesses casos. É uma abordagem mais drástica, que costuma ser tomada depois de outras tentativas. Para a psiquiatra Simone Paes, professora do Idomed - Instituto de Educação Médica, o próprio convívio entre as pessoas têm gerado sofrimento.

“Isso acontece em todos os todos âmbitos, desde o escolar. Quando chega a nível de trabalho, tem se exacerbado porque as vulnerabilidades se encontram. A gente está tendo maior número de assédios e metas para bater. Exigências sempre existiram, mas a forma agora tem gerado sofrimento maior”, afirma.

Entre 2014 e 2024, as profissões que mais tiveram afastamentos foram no setor de bancos múltiplos com carteira comercial (21,8%), seguidos por empregos na administração pública (14,1%), e atividades de atendimento hospitalar (10,1%). Somente no ano passado, os afastamentos nos bancos múltiplos saltaram para 26%, seguido por 11% de profissionais de atividade hospitalar e 10,8% na administração pública.

Hoje, há mais facilidade em acessar os benefícios de afastamento também, de acordo com a médica do trabalho e consultora Ana Paula Teixeira. Para ela, além de um trauma coletivo após a pandemia, o Ministério da Previdência Social lançou um sistema que permite que os profissionais insiram os atestados médicos, ao invés de esperar na fila da perícia médica presencial. Pelo sistema Atestmed, os pedidos são analisados de forma remota.


“Nós também precisamos lembrar que a gente vive em um contexto socioeconômico com as telas, as redes sociais, a solidão crescente, as fake news, a instabilidade política e a violência. Então a gente vive nesse mundo instável, frágil e acelerado que também contribui para o aumento dos transtornos mentais", avalia.

Mudança

Os afastamentos acabam por impactar na economia do país, como lembra o psiquiatra Lucas Alves, professor da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública e diretor da Associação Psiquiátrica da Bahia. Na prática clínica, psiquiatras têm observado mais adoecimento ligados a motivos que incluem a mudança nas relações de trabalho, exigências mais intensas de cumprimento de metas e a própria situação econômica do país.

“Outro fator que influencia também esse número é que as pessoas têm buscado mais auxílio de profissionais de saúde mental. A pandemia desmistificou muito isso”, pondera.

Quando considerados apenas os casos de afastamentos acidentários - ou seja, quando o processo decorre de uma doença do trabalho - 33,2% dos motivados por saúde mental são de transtornos de ansiedade. Na sequência, vêm as “reações ao estresse grave’ e transtornos de adaptação” (27,9%) e episódios depressivos (20,1%).

Ele lembra, ainda, dos casos de burnout. Ainda que não seja considerado estritamente uma doença, o burnout indica uma situação ocupacional em que existe descompasso entre as demandas e capacidade de uma pessoa lidar com elas. “É uma sensação de esgotamento no trabalho, que muitas vezes vem antes da doença mental. O indivíduo não consegue lidar com essa sobrecarga no trabalho e começa a ter sintomas", afirma Alves.


Um mesmo contexto laboral pode fazer com que alguns profissionais adoeçam e outros não, como lembra a psicóloga Mariza Monteiro, coordenadora do núcleo de experiência discente da Afya Salvador. A diferença no processo é como cada um lida com pressões internas e externas, assim como situações adversas. “Cada pessoa tem uma história, uma memória relacional que a gente não traz só para o trabalho", diz a psicóloga.

Além disso, por vezes é difícil separar problemas que estão em outros âmbitos, como a família. “Pessoas na mesma equipe podem entregar as tarefas com mais pressão ou menos pressão. Tem pessoas que precisam ser estimuladas o tempo inteiro, que alguém pressione para que elas possam funcionar. Outras, não. Outras pessoas têm uma pressão interna muito grande e já não convivem bem com essa pressão externa", acrescenta.

Bancários

No ano passado, 26% dos afastamentos foram de profissionais de bancos múltiplos. No entanto, o universo dos bancários fica ainda maior quando considerados os bancos comerciais (3,2% dos casos) e de caixas econômicas (3% dos processos).

“Bancos sempre tiveram muitos casos, mas essas metas exacerbadas vão aumentando. Os bancos exigem que ele (o profissional) entregue produtos ao cliente que, às vezes, nem quer. Isso gera um sofrimento”, diz a psiquiatra Simone Paes, do Idomed.

Segundo o presidente do Sindicato dos Bancários da Bahia, Augusto Vasconcelos, profissionais da área sofrem com condições provocadas pelo número reduzido de trabalhadores. Além disso, ele destaca que é um setor competitivo e que exige cobrança excessiva de metas.


“Com o advento também das novas tecnologias, a situação tem se agravado. Paira sempre uma ameaça constante de substituição dos trabalhadores por máquinas, por algoritmos e por operações automatizadas baseadas em inteligência artificial. Este sentimento acaba também gerando apreensão, abrindo brechas para o desenvolvimento de adoecimento psíquico", diz ele, que está licenciado e hoje também atua como secretário estadual de Trabalho, Renda, Emprego e Esporte.

O atendimento clínico é fundamental, segundo os especialistas. Em muitos casos, em especial aqueles de média e alta complexidade, o uso de medicação vai ser indicado. Em outros, a psicoterapia e mudança de hábitos de vida podem ser os tratamentos indicados. Além disso, segundo a médica do trabalho Ana Paula Teixeira, se um exame periódico ocupacional for feito de forma atenta, é possível identificar desde o início se há necessidade de tratamento.

“É importante que essa situação sirva de alerta para a empresa rever os seus estressores, os riscos ocupacionais e tomar medidas efetivas. Quando a pessoa se afasta pelo INSS, acima de 15 dias, e retorna ao trabalho, é muito importante que haja um acolhimento, um respeito por esse retorno", completa.

O MPT chegou a instaurar inquéritos para investigar ambientes de trabalho com adoecimento. Entre 2020 e 2025, foram instaurados 50 inquéritos civis e nove ações judiciais relacionadas à saúde mental no estado. Segundo a procuradora do trabalho Carolina Novais, o aumento dos afastamentos impulsionou mais esforços para combater o adoecimento mental. Existem novas leis, como a º 14.457/2022, que obriga empregadores a combater o assédio moral e canais de denúncia em órgãos como o próprio MPT.

Uma das mudanças é a Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), alterada em 2024. Ela passaria a valer em maio deste ano, mas foi adiada para 2026. Uma das novidades na norma do Ministério do Trabalho e Emprego é que as empresas têm obrigação de adotar medidas preventivas para proteger a saúde mental dos trabalhadores.

“Um ambiente assediador é propício ao adoecimento”, diz a procuradora. Assédio moral, por definição, é uma conduta que mina a autoestima de alguém no ambiente de trabalho. “O teletrabalho se soma a isso. Ele, em si, não é um fator de risco. Mas pode se tornar mais um fator de risco, se for exercido de forma a extrapolar limites de saúde e sem se atentar a questões múltiplas, como ergonomia e separação de jornada. Tudo afeta a saúde mental”, explica.

 

FONTE: www.correio24horas.com.br  
 
 

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